Cuiabá associa — sem fazer distinção alguma — os que aqui nasceram com aqueles que, vindo de outras plagas, nela se estabeleceram.
Não sem propósito, em seu jeito maneiro e especial de dizer, exibe o cuiabano aos quatro ventos: aquele que come cabeça de pacu não sai mais daqui. É como se disséssemos: identifica-se com Cuiabá.
O professor Germano Aleixo Filho, da Universidade Federal de Mato Grosso, atualmente oferecendo seus préstimos à Presidência do Tribunal de Justiça, tem um trabalho primoroso a respeito desse dito popular. Credita sua razão de ser ao historiador Taunay, que muito escreveu sobre as bandeiras paulistas.
Referindo-se às atrações desta terra encantadora, Taunay pondera: Dizem todos que elas se encerram, principalmente, na meiguice das mulheres, nas cabeças de pacus e caudas de piraputangas. Trate, pois, se não quer encalhar em Cuiabá, de olhar pouco para o sexo frágil e de não provar das extremidades daqueles dois peixes, senão com muita reserva e cautela.
No dizer de meu amigo Germano, essa afirmação traduz, a bem da verdade, uma declaração de amor a Cuiabá. Acorrenta, a um só tempo, a graciosidade da mulher cuiabana ao sabor inigualável dos peixes que eram, sobejamente, oferecidos pelo rio que leva o nome desta cidade.
Permitam-me lhes faça uma revelação. Lendo uma das obras de Dom Aquino – o cantor maior das belezas deste solo –, fiquei estonteado ao saber que o historiador das bandeiras — estou me referindo a Taunay — se encantou com Cuiabá, embora não tivesse tido nem mesmo a felicidade de pisar este chão. A essa conclusão chegamos ao ler o texto de Dom Aquino.
Por serem tão significativas, fiquemos com as palavras do segundo arcebispo de Cuiabá, extraídas do primeiro volume de sua obra intitulada Poética, já no tomo segundo, assim epigrafado: Terra Natal.
Quanta beleza aí deparamos. Assinala Dom Aquino: Não falemos em Taunay, a maior alma de artista, que jamais se pôs em contato com a natureza mato-grossense, onde tudo o enlevava, desde o subsolo coalhado de ouro e diamantes, até o firmamento azul, tão rico de sol, de estrelas e de luares.
Centremos nosso olhar sobre esta cidade que, plena de generosidade, nos acolheu.
É de 8 de abril de 1719 a certidão de nascimento de Cuiabá. Deixemos sua parte histórica para o final de nossa reflexão.
Notadamente após a divisão deste Estado, novos bandeirantes –oriundos do Brasil todo – vêm à procura de outro ouro, que não mais o minério. Decorrência disso: há um amálgama de culturas, a exigir atuação de trabalhadores qualificados. O Nortão deste Estado carecia de ser desbravado.
Não podemos esquecer o papel das universidades nesse processo: Universidade Federal de Mato Grosso, Univag, Unic e Universidade Estadual de Mato Grosso. Formadoras de massa crítica, municiam mão de obra especializada para responder às exigências de um progresso que nos empurra para novos tempos. Quantos dos que aqui se encontram, não se assentaram nos bancos desses centros de cultura!
Pouco menos de cinco anos nos distanciam das festividades do tricentenário de Cuiabá. É preciso que as autoridades — particularmente aquelas às quais entregamos as rédeas de nosso destino político — não se esqueçam dos compromissos assumidos em bem de uma cidade que, objeto do trabalho árduo de nossos antepassados, está a gritar — com todas as forças — seu grito de socorro. Cuiabá – esta obrigação é de todos – não merece ser descaracterizada!
Por ocasião dos festejos alusivos ao bicentenário desta Capital, Dom Aquino nos brinda com um soneto encantador, denominando-a eldorado. É como se dissesse: terra de riquezas, terra repleta de oportunidades.
Aos que desconhecem o soneto, vem ele encimado com este título simples e grande a um tempo só: Cuiabá.
Faço alusão tão só aos tercetos que o encerram — pedra de toque a abrilhantá-lo:
Oh! Cuiabá, das lendas brasileiras,
Foste o sonho de glória das bandeiras,
Eldorado de luz e de bonança.
O teu futuro está profetizado:
Foste a cidade de ouro no passado,
És a Cidade Verde na Esperança.
Cuiabá é fruto do pioneirismo e do arrojo que caracterizaram o bandeirante. O primeiro capítulo desta história merece ser relembrado: foi aberto de maneira nem de longe imaginada. Tendo chegado ao local em que o rio Cuiabá se encontra com o rio Coxipó, a bandeira do sorocabano Moreira Cabral foi rechaçada pelos índios da tribo coxiponés. O bandeirante retrocede decepcionado: afinal, jamais experimentara revés semelhante, tendo perdido, nesse embate, alguns companheiros.
Foi o bastante para que a pilhagem dos rudes sertanistas mudasse seu foco: se, antes, este era voltado para o aprisionamento do índio, agora mirava o filão de ouro encontrado por outro sorocabano: Miguel Sutil.
A notícia do ouro fácil se derrama pelo Brasil inteiro. O local corresponde às imediações da igreja Nossa Senhora do Rosário. Relevante é acentuar que, somente no primeiro mês de mineração, foram extraídos perto de seis mil quilos de ouro. Até difícil de acreditar...
Acresça a isso este fato nada desprezível: o ouro era catado, no mais das vezes, com as próprias mãos: nem ferramentas apropriadas tinham eles. E a população ia se arranchando, cada vez mais, nas proximidades do córrego da Prainha, centro de Cuiabá, seduzida pela miragem do enriquecimento fácil.
O arrojo e a fé andaram sempre de mãos dadas com os sertanistas. Essa ambição desmedida de altos feitos, que timbrou o bandeirantismo, aos poucos se fundiu com o espírito de não menos ousadia, a caracterizar o homem mato-grossense.
Diante de manifestações de carinho tão singelas quanto fascinantes, impossível é não ficar um tanto ou quanto envaidecido nesta noite de outono em que — mera gentileza de quantos nos condecoram — somos agraciados com o título de Cidadão Cuiabano.
Também em nome dos companheiros que partilham desta distinção – um total de cento e vinte –, estampo o sentimento que passeia em minha alma. A par da felicidade que de nós toma conta, agiganta sobre todos uma responsabilidade ainda mais erguida.
Caminho para a conclusão. De certa feita, li em algum lugar uma frase que, definitivamente, ficou gravada em minha memória: sentir gratidão e não expressá-la é como embrulhar um presente e não entregá-lo. Gostaria de reforçar: sentir gratidão e não expressá-la é como embrulhar um presente e não entregá-lo.
Não esquecidos os que, da mesma forma como eu, se sentem deveras orgulhosos ao receberem esta homenagem, manifesto a todos os presentes nosso agradecimento. Nós o fazemos notadamente ao presidente desta Casa, aqui representado pelo Excelentíssimo Senhor Onofre Junior, agradecimento que repassamos igualmente a seus pares.
Permitam-me, não poderia omiti-lo, expressar meu obrigado especial ao vereador Arilson da Silva, que me distinguiu com este título, para mim tão honroso.
Dizem que Deus não está em parte nenhuma, porque está em todas as partes, principalmente no coração de cada um de seus filhos. Que Ele, Pai afetuoso, continue a derramar suas bênçãos sobre nós.
Boa noite a todos!
Cuiabá, 14 de abril de 2014.